Na última quarta-feira, 18, o estádio do Allianz Parque, em São Paulo, estava lotado. E não era jogo de futebol. A reunião de milhares de pessoas aconteceu por conta da apresentação do cantor americano John Mayer, que veio ao País para uma turnê em capitais brasileiras. No entanto, antes do show principal, uma grata surpresa durante a pouco comentada apresentação de abertura: a sensacional dupla de instrumentistas mexicanos Rodrigo y Gabriela.
Quando subiram ao palco, poucos sabiam o que viria. No entanto, aos poucos, ficou claro: a dupla, sem qualquer tipo de vocalização, apresentou músicas aceleradas apenas com as cordas dos violões. Com influências de ritmos latinos, como o flamenco, e até heavy metal, é impressionante ver o trabalho instrumental feito pela dupla. Sem medo de chocar pela agressividade do som de seus instrumentos, Rodrigo Y Gabriela mostraram como a voz, às vezes, é dispensável.
A dupla surgiu em 1997, após uma passagem de Rodrigo e Gabriela pela banda de metal mexicano Tierra Acida. A partir daí, eles começaram a estudar meios de mesclar o ritmo do rock’n’roll mais acelerado com influências claras da música de raiz, criando o gênero híbrido que hoje sai de seus violões. Depois disso, o sucesso começou a aparecer e o primeiro CD da dupla chegou a bater o grupo Arctic Monkeys nas primeiras colocações da parada irlandesa
Desde então, a dupla tem feito um trabalho sólido em todo o mundo -- chegaram a fazer uma série de shows no Brasil no ano passado e fizeram uma apresentação com a cantora Beyoncé na Casa Branca, encantando o público americano. Afinal, é um trabalho elaborado de instrumentalização, que mistura rapidez nas cordas do violão com batidas de percussão na própria madeira do violão, dando um som mais natural e gostoso de ser ouvido em meio a violência de seus movimentos.
Além disso, Rodrigo Y Gabriela contam com uma carga popular muito interessante. Como já li por aí, eles fazem covers de bandas conhecidas do grande público em seus shows, como Led Zeppelin e até Sepultura. Eles, também, fizeram parte da instrumentalização de filmes de sucesso, como Gato de Botas e Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas -- filme ruim, mas que continua tendo uma boa trilha sonora. Ou seja: impossível dizer que a dupla é de nicho. Não é.
Agora, voltando ao show de John Mayer. Como dito, Rodrigo Y Gabriela já tinham feito uma série de apresentações no Brasil. Todas elas, porém, em palcos menores e para públicos bem mais restritos. Afinal, a grande massa brasileira não consegue prestigiar os grupos e duplas instrumentais -- só ver como o excelente Duofel é sempre relegado a uma presença mais coadjuvante em cena. E aqui, esta falta de prestígio se repetiu no estádio do Allianz Park.
Enquanto Rodrigo e Gabriela apresentavam seus números, várias pessoas zombavam da apresentação. Um grupo ao meu lado, várias vezes, disse que aquilo não era música, era só uma “apresentação que tenta mostrar como tocar violão ‘fodamente’”, cheio de ironia e de desprestígio. Duas amigas perto de mim também comemoram quando Rodrigo, no palco, disse que tocaria a última música. “Seria melhor um playback ou um show do Tiago Iorc do que isso aí”, disse uma delas.
Meu sentimento era o pior possível. Rodrigo Y Gabriela fazem um trabalho dificílimo de unir ritmos e levar música popular latina para diferentes locais do mundo -- tudo isso, claro, com um toque do heavy metal. Tocar apenas instrumentos, sem auxílio da voz, é difícil. Muitos acham que falta algo ou que o instrumento deve ser apenas um acompanhamento de um show “de verdade”. Ledo engano. Segurar um público, apenas com dois violões, é tarefa hercúlea.
Rodrigo Y Gabriela, infelizmente, não conseguiram segurar o público -- que depois, ficou delirando com os acordes de John Mayer, dizendo que ele “tocava muito” ou que era incrível sentir os dedos “passeando pelo violão”. Parece que há uma necessidade sempre surgindo de rebaixar trabalho de latinos e exaltar os que fogem de nossa cultura. Afinal, para mim, a dupla de mexicanos tem um apuro musical tão bom quanto o de John Mayer. Senão, ainda melhor.
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