Carlos Vergara é um artista viajante. Ao longo dos últimos anos, ele fez expedições à Serra da Bodoquena, no Mato Grosso do Sul, onde explorou uma importante reserva onde os limites da terra virgem e o impulso humano pela ocupação das terras são evidenciados por grandes plantações, mineração, desmatamento. É a luta entre uma necessária preservação e os impulsos de empresas do agronegócio que passam em cima do que tiver pela frente. Um cenário e tanto para entender, refletir, compor.
A partir dessas observações, e de outras viagens pelo mundo, Vergara produziu uma nova exposição que abriu para visitação no último dia 30 de março, em São Paulo, na Galeria Bolsa de Arte. São esculturas e inspirações impressas em asfalto e sudários que evidenciam algumas das coisas que Vergara viu em suas viagens e observações. No entanto, o artista gosta de ir além em suas definições sobre a exposição. Não há temas, não há barreiras, nem limites. Tudo é aberto para uma própria exploração particular.
"Gosto de chamar de séries e não de um tema único. As ideias das séries sugerem o material. Há esculturas em aço corten originadas em estudos em papel kraft assim como pinturas com asfalto e monotipias feitas com carvão", explica Vergara, em entrevista por e-mail ao Esquina. Sobre o significado, ele vai direto ao ponto, sem firulas: "as peças devem falar por si. O esforço do espectador em ver vai revelar isso."
Na exposição, é possível encontrar, por exemplo, a série Natureza Inventada, produzida entre 2014 e 2019. Recuperando vestígios de uma eventual paisagem, Vergara cria esculturas com peças recortadas de aço corten que se encaixam numa espécie de jogo. Cinco delas em grandes dimensões, com cerca de 250 cm de altura por 120 cm de largura. A robustez do material se converte em corpos de peles suscetíveis às instabilidades do tempo, formando sombras de formas orgânicas e criando tensões entre materialidade e significação, como pode ser visto na imagem abaixo.
A exposição ainda se completa com uma série inédita de assemblages criadas com asfalto líquido e parafina. O preto brilhante do material sobre traços de desenhos abstratos são instalados em telas e pintura acrílica, como é mostrado na foto de abertura desta matéria. E apesar de negar uma temática única, sendo que a exposição é fruto de diversas observações do artista, fica claro como seu trabalho dialoga com a natureza e os avanços sobre os espaços, principalmente no que diz sobre Serra da Bodoquena. Há uma transferência de impressões para a arte, para as esculturas dali.
Questionado se o seu trabalho tem intenção de criticar os atuais desmandos no meio-ambiente promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), Vergara sai pela tangente, mas ainda mostra que há, sim, vestígios de uma crítica. "De uma certa forma há um comentário sobre isso no trabalho, mas é um trabalho de arte e não um panfleto", afirma Vergara. "Portanto esse sentimento entra de forma sútil na construção do trabalho."
Sobre o seu futuro nas artes, Carlos Vergara sabe apenas que tem a viagem como destino, para continuar seu trabalho como artista viajante. "Vou continuar a ser um artista que viaja, que busca inspirações em outros lugares", disse ao Esquina. "Para tanto embarco para uma residencia no sul da França em Maio." Em breve, então, mais Carlos Vergara que, com certeza, vai voltar a impressionar pelo seu senso de observações e tino artístico.
SERVIÇO
O que? Exposição de Carlos Vergara.
Quando? 01 de abril a 11 de maio.
Onde? Bolsa de Arte. Rua Mourato Coelho, 790 - Vila Madalena, São Paulo
Quanto? Gratuito.
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