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Foto do escritorMatheus Mans

Belchior, Almir Guineto, Jerry Adriani e o esquecimento musical


Ao longo das últimas semanas, qualquer fã de música brasileira sentiu o impacto e a dor da perda. Não foi apenas uma, mas três mortes seguidas de grande cantores e compositores: Belchior, Jerry Adriani e Almir Guineto. Cada um em seu estilo, mas todos com três coisas em comum: os 70 anos de idade, o talento musical inquestionável e o esquecimento que permeava seus talentos e as suas obras.

O primeiro a partir foi Jair Alves de Souza — ou Jerry Adriani, como gostava de ser chamado. Dono de uma voz potente, Jerry passeou por todos os rimos e timbres: foi cantor italiano, cantor popular e, no gênero que o consagrou, cantor romântico. No entanto, poucos o conheciam por meio de seu principal atributo e paixão: o rock and roll.

Como disse o repórter Julio Maria, no jornal O Estado de S. Paulo, "o sangue rock and roll de Jerry Adriani possuía um comprometimento maior com a gênese do estilo do que suas próprias canções demonstraram. Reconhecê lo por apenas Doce Doce Amor é conhecê-lo pela metade e reduzir sua importância." Uma pena as pessoas cantarem seus romances melódicos e não lembrarem de sua capacidade musical para o rock.

Além de deixarem de lado o espírito que Jerry tinha de roqueiro, com o passar do tempo, o próprio músico começou a ser deixado de lado. Ainda na reportagem do Estadão, Julio relata como foi sua última conversa com Jerry — que rendeu a última aparição do ex-Jovem Guarda na grande mídia. Segundo a reportagem, "Jerry estava vibrante e abria seu coração para falar do passado e, aos 70 anos, sentia-se justiçado por um espaço generoso na grande mídia."

O último a partir, o sambista Almir Guineto, era querido por todos em seu meio — não é à toa que a sua morte foi muito lamentada por nomes como Zeca Pagodinho, Beth Carvalho e Jorge Aragão. No entanto, pouco espaço foi dado para o falecimento do compositor na grande mídia — enquanto a maioria da morte dos músicos é retratada na capa, Guineto ficou com um espaço pequeno nos jornais do País.

Apenas a Folha resgatou a memória e a importância de Guineto, que reinventou o partido-alto em todo o País e introduziu o banjo no samba de maneira original e inventiva. "Almir era mais do que um 'sambista' ou um 'artista completo'. Ele era uma força demiúrgica, um 'artesão divino'capaz de parir o novo e dar outra forma à matéria existente", disse o texto de Bernardo Oliveira, sem grande destaque no jornal. Importante em seu meio, mas muito esquecido por outros que o consideravam menor no cenário musical brasileiro.

E no meio de Jerry e Almir, que foram esquecidos por maldade do tempo, estava Belchior. Morto aos 70 anos, o poeta cearense optou pelo esquecimento e buscou o anonimato de maneira feroz nos últimos anos, enquanto se refugiava no interior do Rio Grande do Sul e, por vezes, em países do exterior. Era, sem dúvidas, um gênio e que contribuiu ao mundo com canções clássicas como Coração Selvagem, Medo de Avião e Como Nossos Pais.

Ao contrário de Guineto e Adriani, no entanto, Belchior quis ser esquecido. Mas não conseguiu. Ao longo dos últimos anos, jornalistas e fãs buscavam Belchior de maneira incessante. E quando ele morreu, caos. Capas de jornais, revistas. Velório lotado. Tudo que Belchior não queria, tudo que ele sempre evitou. O centro dos holofotes se voltou para o cearense, que só queria o anonimato e a solidão.

Na gênese desses tristes acontecimentos na música brasileira, vemos o movimento natural dos públicos e mídia. Concentramos nossa atenção em apenas alguns poucos nomes musicais — e alguns deles, como Belchior, nem querem mais ser lembrados. Concentramos nossos esforços em novas duplas sertanejas, mas esquecemos de Almir Sater e Renato Teixeira. Falamos sobre novas bandas de rock, mas não lembramos de Jerry Adriani, de Renato e Seus Blue Caps ou dos Golden Boys. Lembramos das novas bandas de pagode, mas esquecemos de Almir Guineto e de Monarco.

Assim, vemos o reflexo do desequilíbrio da música brasileira. Independente do momento que ela vive, é injusto quando esquecemos de alguém com obras vastas e importantes -- como os acima citados e tantos outros. São nomes que, infelizmente, vêm e vão em nossas mentes cada vez mais esquecidas. E que, por fim, estes três tristes acontecimentos mostrem que devemos lembrar de todos que um dia nos fizeram cantar e se emocionar.

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