Curiosamente, dois filmes indicados ao Oscar de Melhor Documentário falam sobre o mesmo tema -- e não poderiam ser mais diferentes. The Cave e For Sama acompanham a rotina de hospitais cravados no meio da zona de conflito. O primeiro, como o próprio título sugere, é debaixo da terra. O outro, enquanto isso, é gerenciado pelo marido da diretora Waad Al-Kateab.
São duas visões distintas e que produzem documentários quase opostos. Em The Cave, que é uma produção do canal National Geographic, há um caráter de observação. A diretora do hospital, Amani Ballour, é o foco de interesse do cineasta Feras Fayyad (Últimos Homens em Aleppo). Ele parte da vida da profissional para versar sobre machismo, violência e resistência.
Já For Sama é uma espécie de carta da diretora Waad Al-Kateab para sua filha -- a Sama do título. Ela mostra como era a vida em Aleppo, na Síria, e como se transformou. O papel do pai, Hamza Al-Khateab, é destacado ao longo dos 90 minutos. Afinal, ele é um dos principais responsáveis por operar o último hospital em atividade na cidade, salvando vidas aos montes.
É impossível, assim, não tecer comparações entre The Cave e For Sama. O primeiro, pelo caráter de distância adotado pelo diretor, acaba emocionando menos, trazendo menos impacto ao espectador. Afinal, apesar da história interessante de Amani Ballour, há mais coisas que chamam a atenção ao redor: o médico que ouve músicas na anestesia, os brigadistas nas ruas.
Enquanto isso, For Sama também foca numa única jornada. Mas há mais força, mais potência. Afinal, é a jornada da própria diretora e ela mantém sua histórias nas mãos. Os sentimentos parecem atravessar a câmera, como se fosse um elo direto entre a diretora-protagonista com o público. É tudo tão verdadeiro, tão emocional e pessoal, que é difícil não se emocionar.
Ou seja: enquanto a história de The Cave passa por algumas pessoas, For Sama é ligação direta. Há apenas Waad Al-Kateab, o público e, também, o co-diretor Edward Watts. É quase mágica.
No entanto, indo além da qualidade de cada um dos filmes, percebe-se a urgência desse tema e como é importante contá-los. Mais do que a ficção, seja séries, curtas ou longas, documentários continuam sendo o meio mais preciso de falar sobre o arredor, sobre a realidade, sobre as nossas vidas. Passa mais emoção que o noticiário, passa muito mais verdade que a ficção.
Algumas cenas ficam marcadas no coração. Crianças chorando, parentes morrendo. Um bebê que nasce morto, um outro que aparece com a mão estourada. O choque é imediato. A esperança surge nas beiradas, vendo a atitude dos protagonistas dessas histórias. São filmes que dão pauladas e, depois, tentam mostrar como as coisas podem melhor. Exigem ações.
Esses dois filmes "oscarizáveis" chamam a atenção do mundo, por meio da premiação, para a falta de humanidade que acontece na Síria e arredores. Mais do que falar sobre refugiados, tema que está se esgotando, The Cave e For Sama buscaram na fonte, na base. The Cave de uma forma mais objetiva. For Sama, de maneira apaixonada e passional. Pronto pra ser obra-prima.
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