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Foto do escritorMatheus Mans

Com 'O Sorriso da Hiena', Gustavo Ávila renova literatura policial nacional


Dizem que, após passar por estiagens e fortes invernos, a literatura floresce tal qual estações primaveris. Seria um tempo natural e que é alimentado ciclicamente: uma geração morre enquanto o terreno é preparado para a nova que é semeada. Hoje, é inegável que a literatura policial brasileira passa por forte renovação, após período de vacas magras, revelando nomes como Raphael Montes, Cesar Bravo e Gustavo Ávila.

Este último surgiu de maneira tímida, na internet, e hoje já ganha terreno no País. Nascido e criado em São José dos Campos, no interior de São Paulo, Ávila foi um sucesso estrondoso na web com seu livro O Sorriso da Hiena, que acompanha a trajetória de David, um homem que presenciou o assassinato dos pais e que agora tenta ajudar um psicólogo em estudos sobre a mentalidade humana. É um daqueles livros brutais e viscerais que arrebatam qualquer um.

Hoje, o sucesso bate à porta de Ávila. Depois da conquista do virtual, o paulista terá o seu livro publicado pela Editora Verus e teve os direitos autorais da obra comprados pela Rede Globo. Inegavelmente, é um sucesso. Por isso, o Esquina conversou com Ávila sobre seus projetos, sobre o sucesso, os (possíveis) segredos e sobre a vida. Confira, abaixo, os melhores trechos da entrevista:

Esquina da Cultura: De onde surgiu a ideia do livro ‘O Sorriso da Hiena’?

Gustavo Ávila: Essa história toda começou há uns dez anos. Não lembro exatamente quando tive a ideia, mas foi quando morei pela primeira vez em Florianópolis. Tive o princípio da ideia, anotei e deixei lá. Só fui pegá-la anos depois, já morando em São Paulo novamente. Foram cerca de três anos escrevendo e reescrevendo. Depois de tentar todas as editoras possíveis, resolvi lançar de forma independente. Raspei boa parte do dinheiro que tinha guardado e investi no livro.

Já teve o retorno financeiro?

Bem pouco. Como a história ainda não foi republicada pela editora, que irá acontecer em breve, eu mais investi dinheiro do que recebi pela história. Mas é um começo. E acredito e espero que um dia essa realidade mude. Estou trabalhando bastante para fazer isso acontecer. Mas eu já tive minha maior conquista, que é a confiança dos leitores. Mais do que ter uma grande editora por trás e por ter vendido os direitos de adaptação para a Globo, ter pessoas querendo ler a sua história é a maior conquista.

Como está este processo na Globo? Vai rolar uma série? Tem previsão?

Eu vendi os direitos no final de 2016. Agora eles tem dois anos para decidir o que vão fazer ou se vão realmente fazer alguma coisa. Eu não tenho muitas novidades sobre isso, até porque é um processo interno da Globo. São muitas questões envolvidas em um projeto desse tipo. Eu não sei se será série, filme, realmente não sei. Na verdade, tento nem pensar muito sobre isso. Como não está mais em minhas mãos, eu quero focar no que eu posso fazer, que é escrever as próximas histórias.

Além da Globo, quais outros projetos você planeja?

Meu foco está em terminar meu segundo livro, que tem o nome provisório de Quando a luz apaga. Também será um romance policial e com o mesmo detetive de O sorriso da hiena. Mas as duas histórias não terão nenhuma ligação entre elas, além disso. Tenho um outro projeto em mente que ainda estou desenvolvendo, que será uma história que irei disponibilizar em capítulos no meu site. Mas ainda não comecei a trabalhar nela porque o foco é o segundo livro. Também já tenho a ideia para o meu terceiro livro, que sairá do universo policial, apesar de ser uma investigação arqueológica, e que se passará no Brasil e na África.

O seu livro foi muito elogiado, mas você teve que publicar de forma independente no começo. O que aconteceu? Você acha que foi preconceito por ser um autor jovem?

É simples: eu não consegui uma editora. Conseguir uma editora é algo bem difícil, ainda mais para um autor novo. Tentei muitas delas, talvez todas, mandei e-mail para uma infinidade de editores, muitos foram bem receptivos e gentis, muitos outros nem responderam. Não se cansar faz parte do trajeto. É preciso ter paciência, mas não se acomodar. Por isso, depois de muito tentar, resolvi investir na publicação independente.

O mercado está fechado?

Não sei se a palavra certa é fechado. É um mercado difícil de entrar, sim. Mas acredito que essa dificuldade seja um reflexo do mercado leitor. O mercado editorial é um negócio e ele vai se movimentar para atender a demanda dos leitores, que são clientes. Se os leitores buscam somente ou, em grande parte, as mesmas histórias, o mercado editorial vai separar a maior parte dos seus recursos para atender essa demanda. E ainda por cima, se o mercado de leitores é pequeno, como é no Brasil, isso reduz ainda mais as possibilidades de expansão do mercado editorial. São muitas as etapas para melhorar isso.

Quais são as etapas?

A primeira delas é a principal, mas é justamente a mais difícil e a que mais demora para vermos resultado: a educação das crianças. É o incentivo para leitura nessa fase. É a mais difícil porque a educação no Brasil ainda precisa melhorar muito. Principalmente em regiões menores, em locais mais afastados das capitais. É uma ação que requer mais vontade e muitas mudanças na política e nos políticos que comandam nosso País. No entanto, é a ação que que dará um resultado concreto, enraizado. É diferente de uma “ação curativo”, como é feito em estradas esburacadas, por exemplo, que o poder público vai lá e “joga asfalto” nos buracos que se abrem, dão umas batidinhas e pronto. Não resolve nada. Logo os buracos aparecem de novo e de novo e de novo. E vai se gastando mais dinheiro, quando na verdade é preciso resolver problemas estruturais da estrada. É preciso construir a estrada desde o começo da forma certa. O mesmo deve ser feito na educação. Os alunos, que deveriam ser preparados de verdade enquanto crescem, se tornam adultos como nossas estradas: cheios de buracos. Só seremos um País que lê quando nos tornamos um País que educa. O negócio do mercado editorial, além de ganhar dinheiro, claro, acaba sendo também o de tapar buracos, criando interesse com as histórias que coloca nas prateleiras. Mudando o mercado leitor é que vamos mudar o mercado editorial.

Enquanto o mercado não muda, quais dicas você dá para quem está tentando agora emplacar uma carreira de escritor?

Escrever bastante, claro. Mesmo que publicar ainda esteja longe. Vai escrevendo e guardando suas histórias. Escrever é algo que você vai ficando cada vez melhor. E ir atrás, estudar as formas de chegar nas editoras, ver como outros autores conseguiram ser publicados para tentar fazer o mesmo. Querendo ou não, é muita tentativa, tentativa e tentativa. E caso não consiga entrar em uma editora de primeira, existem muitos outros meios de colocar sua história nas mãos de leitores. Eu sou a prova disso. É possível colocar em blogs, em plataformas como Wattpad. E não se dê por vencido. É difícil. Muito. É algo que demora para dar resultado, a não ser, claro, que seja um daqueles fenômenos que estoura de uma hora para outra. Mas, normalmente, é um caminho lento e passo a passo. Mas que vale a pena quando é o que se quer com todo o seu coração.

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