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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'A Rota Selvagem' é drama profundo e incômodo


Lean on Pete, título original do filme que ganhou o péssimo nome de A Rota Selvagem no Brasil, se refere ao cavalo homônimo que o protagonista Charley (Charlie Plummer) rouba de seu chefe Del (Steve Buscemi). Mas ao contrário do que possa parecer, o novo longa-metragem do melancólico diretor Andrew Haigh (45 Anos) não é sobre a amizade de um garoto com seu cavalo. É, acima de tudo, uma história melancólica sobre perda, luto, autodescoberta e, principalmente, amadurecimento.

Charley é um rapaz de 15 anos que vive apenas com o pai. A mãe o abandonou e o único contato com o resto da família é uma tia, que cortou laços após um incidente. O adolescente, se sentindo cada vez mais sozinho, decide buscar um emprego para passar o tempo e ajudar nas contas de casa. A única saída é ajudar Del, o dono fracassado de cavalos de corrida. Tudo vai bem até que Charley passa por mais um trauma e, como saída, decide roubar Lean on Pete, um cavalo velho e lento do grupo.

A partir daí, Haigh faz o que sabe de melhor: cria uma trama pesada, extremamente melancólica e dramática, que ganha contornos de difícil digestão em grande parte de sua história. Mistura de filme de amadurecimento com road movie, A Rota Selvagem não deixa de ser um longa-metragem sobre autodescoberta na juventude, quando as dúvidas começam a surgir com força e o destino parece cada vez mais incerto. Mas nada de histórias leves e teens. O cineasta pega pesado nos tons obscuros do período.

Há uma confusão de foco narrativo que atrapalha um pouco a absorção geral da trama. Ainda que possam se complementar, os dois subgênero empregados no roteiro -- coming of age e road movie -- acabam se estapeando ao decorrer da história, atrapalhando o andamento geral. Parece que Haigh, que também é roteirista, não soube deixar um estilo narrativo se sobressair frente ao outro, tentando equilibrar a maneira de contar a jornada de Charley. Como pode ver no filme, essa estratégia não deu certo.

No entanto, outros elementos acabam levantando esse pequeno problema de Haigh. O elenco, por exemplo, está no ponto. Charlie Plummer (Todo o Dinheiro do Mundo) mostra-se, novamente, como um grande nome da nova geração de Hollywood. Em Lean on Pete, ele sabe misturar sentimentos e internalizá-los -- mas, mesmo assim, transparecendo-os para a audiência. Steve Buscemi (A Morte de Stálin) e Travis Fimmel (O Plano de Maggie) também elevam a qualidade na primeira metade, quando tomam o posto de coadjuvantes de luxo. Chamam a atenção e desempenham bem seus papéis.

A qualidade técnica de Haigh contar uma história melancólica também é visível em tela. A fotografia, de tons roxos e sombreados, criam o clima, enquanto o filme não cansa de trazer acontecimentos catastróficos ao longo da história. Por mais que algumas soluções sejam fáceis demais no roteiro, A Rota Selvagem acaba compensando com uma jornada melancólica e pouco cansativa, ao contrário do estafante 45 Anos. Uma pena que alguns possam considerar as saídas fáceis de roteiro mais predominantes do que a coragem geral do longa-metragem. Não é fácil falar sobre perda e luta nesses tons.

Assim, A Rota Selvagem é um filme profundo, melancólico, triste e com uma forte e contundente mensagem por trás. Não é fácil de digeri-lo. Há, sim, problemas de foco narrativo e um segundo ato arrastado -- principalmente quando Buscemi e Fimmel saem de cena. Mas nada que prejudique demais o longa-metragem, que se revela como um dos filmes mais contemplativos da temporada. Quem sabe, pode chegar com fôlego para tentar abocanhar algumas das premiações do Academy Awards de 2019.

* Filme assistido durante a cobertura especial para a 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

 

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