Há quem diga que a monogamia foi um comportamento adotado socialmente pelos indivíduos, pois, na realidade, os seres humanos, assim como todos os animais na natureza, são biológica e psicologicamente poligâmicos. Independente disso, falar de relacionamentos abertos ainda é um tabu, mesmo que isto esteja sendo desconstruído aos poucos. Na 42ª Mostra Internacional de Cinema, o russo Eugene Kotlyarenko discute o tema numa espécie de relato pessoal em seu novo filme A Casa Dividida.
Quando o filme se propõe a falar de relacionamentos modernos, se assim podemos chamá-los, inevitavelmente acaba por tratar também sobre as pessoas que o vivem, e a forma como lidam com um sentimento de solidão. Após perceberem que se encontram num relacionamento falido, o jovem casal Eugene e Jane (Dasha Nekrasova) decide ser poligâmico, ainda que isso signifique dividir a mesma casa. Para Eugene, a melhor maneira de aproveitar isso se dá a partir de inúmeros encontros no Tinder, que raramente têm continuidade. Jane, por sua vez, encontra-se reconectando com antigos amigos e mantendo um relacionamento com um homem totalmente oposto à ela.
O filme, apesar de bom, tenta explorar coisas extremamente complexas em menos de uma hora e meia e acaba sendo superficial na maioria delas. Kotlyarenko tentou trazer a política, visto que fala de um casal que se conheceu durante as eleições de 2012 e estão prestes a romper nas eleições de 2016. Algumas críticas à Trump são trazidas, porém pouco aprofundadas. Também tentou fortemente caracterizar Jane como uma garota básica norte-americana, ainda que a mesma se esforce ao máximo para ser diferente, criativa.
O fato de Kotlyarenko ser o diretor e protagonista da história faz o espectador sentir que está vivenciando um relacionamento dele que deu errado. Mais do que isso, existem momentos em que a grande vítima é o próprio Eugene, seja em seus rápidos encontros onlines ou até na forma que Jane o humilha. Ainda que seja fácil ter empatia pelo rapaz, isso é problemático na medida em que um relacionamento é sempre uma via de mão dupla, e, dificilmente, apenas um deles estará completamente errado.
A Casa Dividida é um filme totalmente direcionado para uma geração, os chamados millennials. Quem faz parte desse grupo, automaticamente se identifica. No entanto, o longa pode não funcionar tão bem para um público mais velho. Mesmo assim, acerta em cheio ao falar da solidão como um sentimento que deve ser suprimido o mais rápido possível, principalmente através de relacionamentos. Trabalha bem o lado escuro da poligamia, em que, muitas vezes, está longe de ser uma solução para um relacionamento.
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